Antes de entrarmos na explicação das condições para a exploração e uso de uma obra protegida por direitos autorais, precisamos demonstrar o que a legislação brasileira protege e entende como direito autoral.
A Lei 9.610/98, em seu art. 7º, tenta explicar o que são obras intelectuais e quais as formas que serão passíveis de proteção legal. Vejamos o caput do citado artigo:
Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como [...].
Percebe-se que, para a legislação brasileira, são obras intelectuais as criações de espírito que são “colocadas” e/ou expressadas em um suporte tangível ou intangível. Ou seja, para uma obra ser protegida ela deve ter saído do campo das ideias e estar manifestada em algum local possível de ser visto e/ou localizado.
A legislação autoral, no mesmo artigo supracitado, exemplifica algumas obras intelectuais protegidas, tais como: os textos de obras literárias, artísticas ou científicas; as composições musicais, que tenham ou não letras; as obras audiovisuais, sonorizadas ou não, inclusive cinematográficas; as obras fotográficas e as produzidas por qualquer processo análogo ao da fotografia. Ademais, cabe ressaltar que a Convenção de Berna, da qual o Brasil é signatário, também dispõe sobre as obras intelectuais que deverão ser protegidas sem, contudo, esgotar as possíveis criações.
Nesse sentido, ao criar uma obra intelectual o autor tem o seu direito protegido, seja ele o direito patrimonial da obra, por exemplo, o direito de exploração econômica, seja o direito moral sobre a sua criação, que concede a parte reivindicar a sua autoria, ter seu nome sempre vinculado à obra e outras questões pertinentes à personalidade do autor e sua criação.
A obra autoral pode ser explorada e utilizada por terceiros de diversas maneiras, sempre de modo a observar a não afronta à imagem do autor e outras vedações legais, considerando também o direito moral do criador – este que não será discutido neste presente artigo.
Para que terceiros tenham o direito de utilizar obras intelectuais protegidas estes devem solicitar, prévia e expressamente a autorização do autor ou titular daquela obra. Os caputs dos artigos 29 e 68 da Lei 9.610/98 são assertivos quanto a esse fato. Vejamos:
Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como: I - a reprodução parcial ou integral [...].
Art. 68. Sem prévia e expressa autorização do autor ou titular, não poderão ser utilizadas obras teatrais, composições musicais ou lítero-musicais e fonogramas, em representações e execuções públicas.
Ao observamos a regra contida nestes dispositivos, percebemos o quão importante é a autorização expressa do autor para que terceiros possam explorar a sua obra. Destacado isto, recentemente tivemos um impasse entre um cantor de funk e a emissora SBT que envolveu a utilização indevida de obra protegida por direito autoral. A emissora utilizou um trecho da música de titularidade do cantor como título de um programa televisivo e, ainda como abertura do mesmo programa, foi colocado parte do fonograma para executar a vinheta de abertura.
O caso chegou à Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que condenou a emissora a pagar R$ 20.000,00(vinte mil reais) ao cantor, a título de danos materiais, pela utilização indevida de um trecho da música “Ela só pensa em beijar” como nome do programa de televisão e ainda parte de sua execução na abertura. A parte da música utilizada foi “Se ela dança, eu danço”, sendo que essa canção foi muito executada no Brasil inteiro no início dos anos 2000. A emissora SBT tentou se valer do argumento de que enviou um e-mail para a produção do cantor de modo a buscar a autorização e este não foi respondido, para tanto, a emissora compreendeu que a falta de resposta significaria autorização tácita.
Não cabem dúvidas quanto ao fato de que a emissora usou indevidamente de obra intelectual de terceiros, pois não obteve autorização expressa do titular da obra. No referido julgado, REsp 1704.189 – RJ de Relatoria do Min. Ricardo Villas Bôas, o Ex. Relator afirmou:
Desse modo, não há falar em autorização tácita por ausência de resposta ao e-mail enviado pela ré.
Ademais, a Corte de origem, soberana no exame do acervo fático-probatório, concluiu que a ora recorrente não cumpriu com os trâmites e as formalidades previstos nos convênios acostados aos autos para obter as autorizações para utilização de fonogramas.
Desta maneira, entendemos como acertada a decisão na condenação da emissora por uso indevido de obras visto que, não houve cumprimento dos requisitos essenciais para a exploração da música por parte do SBT, já que não ocorreu a prévia e expressa autorização do titular/autor. Requisito este que, como demonstrado de forma breve no presente texto, deve ser minuciosamente observado nas relações entre autores, titulares e possíveis exploradores econômicos da obra intelectual.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. Diário Oficial da União. Brasília. Distrito Federal, 20 fev. 1998. Disponível em:
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9610.htm > Acesso 25 out. 2020.
STJ. Superior Tribunal de Justiça. SBT terá de indenizar cantor de funk por uso de letra de música como nome de programa. 2020. Disponível em:
< http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/21102020-SBT-tera-de-indenizar-cantor-de-funk-por-uso-de-letra-de-musica-como-nome-de-programa.aspx > Acesso 25 out. 2020.
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