Em algumas oportunidades, nos deparamos com o noticiário informando sobre suposto escândalo de pagamento de atletas, árbitros ou outras pessoas do meio esportivo, visando a manipulação de resultados.
Recentemente, foi exposta denúncia do Ministério Público de Goiás de oito jogadores de futebol por suposta manipulação de resultados na Série B do campeonato brasileiro de 2022. Com isto, surge o seguinte questionamento: qual é a responsabilidade das casas de apostas sobre as manipulações de resultado? Vítima ou culpada?
Antes de entrar no mérito da questão, é importante destacar que as apostas esportivas tiveram permissão para operar no Brasil por intermédio da edição da Lei n. 13.756/2018. Porém, esta mesma lei previa que em dois anos, prorrogável por mais dois, haveria a necessidade de criação de uma regulamentação específica, o que não ocorreu e acabou vencendo o prazo final dessa edição no ano passado.
Com a atividade legalizada, embora não tenha acontecido a criação da regulamentação específica para o mercado de apostas esportivas, este fator não deve influenciar o dia a dia dos operadores, vez que praticamente todos eles operam por meio de empresas fixadas no exterior (offshores).
Pois bem, sem a edição de uma regulamentação para o setor, as casas de aposta operam em um mercado brasileiro sem regras claras, o que chamamos de limbo jurídico e, consequentemente sem a adequada fiscalização, que permite que eventuais problemas judiciais, em tese, não tenham a competência para serem resolvidos na justiça brasileira. É aí que está o problema.
Com a falta de regulamentação não há como definirmos as responsabilidades de cada um dos atores desse mercado e em quais esferas serão cobradas essas obrigações, o que traz instabilidade para o setor e inclusive abre brechas para o aparecimento das manipulações de resultado. Ora, como exigir de uma casa de aposta esportiva uma maior fiscalização se ela está instalada em território brasileiro? Como os apostadores irão exigir reparação de seus direitos juntos à justiça brasileira? Como serão descobertos aqueles que se beneficiam das apostas para manipularem resultados? Qual seria a forma de tributação da atividade?
Essas são questões que surgem ao analisar todo o contexto desse mercado.
De outro lado, respondendo a pergunta inicial que ensejou esse texto opinativo, temos que entender que todo o ecossistema é prejudicado com as denúncias de manipulação de resultado, principalmente o esporte, uma vez que fere o princípio básico da imprevisibilidade de resultado, retirando descaradamente a graça da partida, qual seja, a possibilidade de qualquer tipo de resultado.
Neste sentido, entendo que não há como estabelecer culpa direta das casas de apostas esportivas quanto às manipulações de resultado, entretanto elas devem criar mecanismos para prever, prevenir e gerenciar essas hipóteses, inclusive comunicando essa preocupação aos apostadores e organizadores daquela partida. As casas de apostas se beneficiam do mercado esportivo, o que consequentemente atribui a elas o dever de zelar pelas regras do jogo, protegendo os princípios da imprevisibilidade do resultado e da integridade das competições.
Desta maneira, é urgente e extremamente importante a edição de regulamentação para o setor, ouvindo os anseios e opiniões de todas as partes do mercado, Poder Público, Casas de Apostas, Confederações, Federações esportivas, Detentores de Transmissão, Clubes e Atletas, para a tentativa de formação de um ambiente mais íntegro.
Tratando-se sobre o envolvimento dos atletas na manipulação de resultados, este tema merecerá até outro artigo para falarmos disso, pois existem inúmeras questões mais problemáticas inerentes a profissão.
Por fim, acredito que até mesmo as grandes casas de apostas esportivas veem a regulamentação do setor como necessária e benéfica, pois com as regras mais claras se organiza a concorrência e formatará um mercado que dará destaque àquelas com boas práticas de governança, integridade e responsabilidade com o esporte brasileiro.
Referência
BRASIL. Lei 13.756/2018. Dispõe sobre o Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP), sobre a destinação do produto da arrecadação das loterias e sobre a promoção comercial e a modalidade lotérica denominada apostas de quota fixa; altera as Leis n º 8.212, de 24 de julho de 1991, 9.615, de 24 março de 1998, 10.891, de 9 de julho de 2004, 11.473, de 10 de maio de 2007, e 13.675, de 11 de junho de 2018; e revoga dispositivos das Leis n º 6.168, de 9 de dezembro de 1974, 6.717, de 12 de novembro de 1979, 8.313, de 23 de dezembro de 1991, 9.649, de 27 de maio de 1998, 10.260, de 12 de julho de 2001, 11.345, de 14 de setembro de 2006, e 13.155, de 4 de agosto de 2015, da Lei Complementar nº 79, de 7 de janeiro de 1994, e dos Decretos-Leis n º 204, de 27 de fevereiro de 1967, e 594, de 27 de maio de 1969, as Leis n º 6.905, de 11 de maio de 1981, 9.092, de 12 de setembro de 1995, 9.999, de 30 de agosto de 2000, 10.201, de 14 de fevereiro de 2001, e 10.746, de 10 de outubro de 2003, e os Decretos-Leis n º 1.405, de 20 de junho de 1975, e 1.923, de 20 de janeiro de 1982.
COCCETRONE, Gabril. Prazo para regulamentação da lei das apostas esportivas no Brasil chega ao fim. O que muda?. Lei em Campo. Disponível em < https://leiemcampo.com.br/prazo-para-regulamentacao-da-lei-das-apostas-esportivas-no-brasil-chega-ao-fim-o-que-muda/ > Acesso em 19 de março de 2023.
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